E o meu ano já começou assim, de tempo fechado.
Cheio de nuvens carregadas e estranhas.
A correria das pessoas, adiantando o passo por prever a grande chuva, era o que mais me preocupava. Junto com elas, corria o tempo, entre meus dedos.
Depois, as nuvens mais escuras vieram, e com elas, os trovões.
E o barulho doía às orelhas e acelerava o coração.
O vento começava ficar frio, bagunçava as árvores e os cabelos.
As folhas então começavam a cair.
E também os primeiros pingos da chuva.
Caindo lenta e ritmicamente ao chão, espatifando-se, espalhando-se e penetrando na terra.
O vento mais forte ficava, minhas mãos não mais serviam para segurar os cabelos, a roupa ou para proteger-me da chuva.
Comecei a me encharcar.
Então, vieram os raios.
E as repentinas claridades, os fios amarelados cortando os céus, o barulho poderoso dos trovões e a chuva que caía, agora forte e pesada, como lágrimas infinitas vindas de cima.
Parada ali, no meio da tempestade eu senti o frio do corpo molhado, o incômodo quase doloroso dos grossos pingos que caíam no meu rosto e cabeça.
O vento que cortava os frágeis galhos das árvores e arrastava consigo as folhas que grudavam nos meus cabelos pesados pela água.
Foi então que eu senti, pela primeira vez, o quão monstruoso era estar só no olho da tempestade. Mas o quão belo era aquele espetáculo.
Eu nunca vou esquecer da sensação de impotência diante daquilo tudo.
Porque, ali no meio de tudo, eu não era a causa ou a consequência. Eu fazia parte daquele todo. Estava no cenário, apesar de não ser a personagem principal.
Eu passei pelos pingos grossos e gelados, pelo vento cortante e frio, pela roupa molhada e cabelos grudados na cabeça. Passei pelo barulho dos trovões, pelo vislumbre dos perigosos raios, passei pelas lágrimas quentes descendo pelo meu rosto e misturando-se aos pingos da chuva.
Passei pela dor, pela perda, pela decepção, pelo vazio e pela maré problemática que a vida me trouxe.
Passei, como pela chuva. Senti na pele, aguentei e vi aquilo tudo passar.
Vi que não tinha motivos pra temer a tempestade pois depois dela, mesmo com o cenário bagunçado, sempre vem a calmaria e o agradável cheiro de terra molhada. A superação que se sente, o ar fresco que entra pelas narinas, a liberdade e a certeza de que, por essa tempestade você não foi levado.
Então, quando tudo estiver frio, cinza e doloroso, lembre-se, mocinha.
Lembre-se de que, depois da tempestade, o tempo sempre será ensolarado e brilhante.